Rosane Svartman (foto: Estevam Avelar/TV Globo)

Nilson Xavier – 28/05/2020, 07:00.

A edição especial de Totalmente Demais tem rendido ótimas audiências para a Globo. De acordo com Flavio Ricco, em sua coluna no UOL, são 28 pontos de média no PNT, a melhor no horário das 19h nos últimos sete anos.

Quem também está vendo a novela de novo é a autora Rosane Svartman, que a escreveu em parceria de Paulo Halm. São curiosas as reações de Rosane em sua conta no Twitter: torcendo, comentando entrechos que não lembrava, ora surpresa, ora reprovando coisas que ela mesma escreveu.

Livre da estiva, da pressão e da obrigação de entregar capítulos diariamente, Rosane agora é mera espectadora de sua cria, em posição distinta da que ocupava em 2015-2016, quando escreveu a trama. Agora, talvez, com olhar mais apurado, capaz de captar sutilezas ou detalhes que passaram despercebidos à época.

O distanciamento no tempo e o contexto em que a novela foi escrita contribuem. Afinal, após Totalmente Demais, ela e Paulo Halm escreveram outra trama de repercussão maior ainda, Bom Sucesso (2019). Também o fato de o mundo estar bem diferente do que era até pouco tempo, por causa da pandemia de Covid-19.

Bati um papo com Rosane Svartman imaginando o quão curioso, e até engraçado, é estar nessa posição, como público.

Assistindo à novela hoje, o que você mudaria?

Sinto que muita coisa mudou nos últimos anos, principalmente no que diz respeito às questões identitárias, de gênero. Existe também uma demanda maior por diversidade e representatividade. Ainda bem. Então, vendo a novela hoje, cinco anos depois, sinto que poderia abordar mais estas questões ao longo das trilhas dos personagens. Não seria nada estrutural. Fico me coçando porque obviamente a novela agora virou obra fechada. Mas, ao mesmo tempo, ver a novela sempre que posso e interagir pelas redes sociais tem deixado meus dias mais leves.

Você se culpa ou se envergonha por algo que foi feito/escrito? Você ri ou acha engraçado algum entrecho ou solução que foi criada?

Eu sempre me culpo por algo, sempre tenho vergonha de um ou outro rompante (…) Como uma novela é escrita no calor do momento, muitas vezes escapam frases, referências. Normal. Muitas vezes dá tempo da gente consertar em outro capítulo (como foi o crédito da música tema de Gabriela em Bom Sucesso, por exemplo). Mas em Totalmente Demais posso dar alguns exemplos concretos de coisas que mudaria. Acho que poderia ter mais sonoridade entre Lili (Vivianne Pasmanter) e Carol (Juliana Paes), por exemplo. Um exemplo específico de cena seria a briga física de Rosângela (Malu Galli) e Maristela (Aline Fanju) por Florisval (Aílton Graça), isso me incomodou. Outra coisa que me agonia é essa mania dos homens de pegar as mulheres pelo braço.

Fábio Assunção, Marina Ruy Barbosa e Felipe Simas (foto: Artur Meninea/TV Globo)

Eu queria esses momentos de “putz, olha isso!“, “nem lembrava mais“.

Todo dia eu tenho um momento “nem lembrava disso“. Pode ser um diálogo ou até mesmo uma cena. Um exemplo foi a homenagem a Avenida Brasil em que a personagem Sofia (Priscila Steinman), vendo a novela, fingiu se chamar Nina. As loucuras de Cassandra (Juliana Paiva), sua falta de noção, me divertem, mas nem eu lembrava a que ponto ela chegava. O carisma e talento da Ju Paiva ameniza e torna engraçados os absurdos que ela faz. Eu lembrava que ela dopava o Jonatas (Felipe Simas), claro. A cena dele dançando na festa é antológica e adoramos escrever pro Felipe, que faz drama e comédia com o mesmo vigor. Mas tinha esquecido que ela antes dopava o próprio pai só para testar. Ver o Orã [Figueiredo] fazendo comédia é sempre uma delícia, claro – que ator! – , mas achei uma loucura lembrar como a Cassandra era inconsequente. Rio alto com piadas que eu conheço, e portanto repetidas. Por exemplo, Stelinha por Gloria Menezes é uma delícia. Lembro dela se comparando a Vivien Leigh em E o Vento Levou, claro. Mas as pequenas piadas do dia a dia, afiadas, escritas em sua maioria pelo incrível Mario Viana [colaborador], nem sempre eu lembro, por exemplo.

A novela envelheceu? Bem ou mal? Em quais aspectos e abordagens? O que levaria de outra forma, ou mudaria o tom?

Eu acho que a novela envelheceu bem. Me orgulho dos temas que abordamos e da forma como fizemos isso. Falar de assédio, pedofilia, violência urbana, homofobia, rejeição paterna numa novela das 19 horas não é fácil. A história de superação e transformação da Eliza, nossa mocinha desbocada e feroz defendida de forma estupenda pela Marina [Ruy Barbosa], é um clássico e portanto acho que permanece mesmo com o passar do tempo. A gente resolveu reviver Sofia (Priscila Steinman) quando a novela teve que ser estendida, mas já tínhamos na manga essa possibilidade, por isso escrevemos que no acidente o carro explodia e os corpos eram carbonizados. Pesamos no melodrama nessa trilha, até porque sabíamos que a Priscila e o ótimo núcleo em que ela estava segurava o tranco. Acho que saiu um pouco do tom do resto da novela. Mas foi recorde de audiência, para nossa surpresa.

E o outro lado: o que você acha hoje melhor do que a impressão que teve quando foi ao ar pela primeira vez? O que subestimou, ou menosprezou na época?

Eu achava Carol (Juliana Paes) dura demais no início. Não pela atriz, maravilhosa, mas pela personagem que a gente escreveu mesmo, as coisas que ela fazia e falava, o jeito que se vestia, o cabelo preso, super liso. Ela acabava virando uma vilã e não apenas uma antagonista. Mas sabe que agora eu tô gostando? Acho que é porque eu sei pra onde a personagem vai, tudo que ela vai sofrer e como vai se transformar. E também o ótimo trabalho da Ju Paes em defender a personagem durante esse arco faz diferença. Eu também achei que em certo momento eu e o Paulo Halm tínhamos exagerado nas citações do Arthur. Ainda mais que ele sabe tudo de cor. Mas hoje, assistir o Fábio Assunção falando poesias é um dos melhores momentos do meu dia.

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