Lucy Ramos e Cadu Libonatti (foto: reprodução)

O capítulo de sábado (10/08) de A Dona do Pedaço exibiu uma cena digna de repulsa por qualquer telespectador. Um aluno adolescente revoltado com a nota baixa recebida pela professora lhe desfere um sonoro tapa na cara. A cena foi protagonizada por Cadu Libonatti, como Merlin, o aluno, e Lucy Ramos, Silvia, a professora. Os mais desavisados poderiam pensar: “Opa, a novela vai tratar da violência de alunos contra professores.

Na sequência, mais cenas lamentáveis. A professora se nega a prestar queixa contra o aluno agressor “porque precisa do emprego”. E o irmão mais velho de Merlin (personagem de Rainer Cadete) até o repreende, mas termina dando-lhe um tapinha nas costas. Ou seja, passou a mão na cabeça do agressor. Pensei: vamos aguardar os próximos capítulos para ver como o autor Walcyr Carrasco desenvolverá essa situação.

No capítulo dessa segunda (12/08) – PASMEM – Merlin, de agressor, foi tratado como vítima. Todos ao seu redor foram compreensíveis “porque ele é um jovem revoltado, não conhece o pai e a mãe é ausente e omissa”. E ficou por isso mesmo. Procurei nos resumos das próximas semanas e não encontrei registro do que acontecerá a Merlin. De Silvia, a professora agredida, apenas mais desdobramentos de seus quiproquós românticos com Márcio e Kim.

De acordo com matéria publicada nesta segunda (12/08) no site da BBC (por André Bernardo), “o Brasil lidera o ranking de violência escolar: 12,5% dos docentes brasileiros relataram ser vítimas de ameaças, xingamentos ou agressões ao menos uma vez por semana.” Esses dados são de 2013, os mais recentes levantados pelo Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). A média mundial da organização, que reúne 34 países, é de 3,4%. No Brasil, é 12,5%.

Foto: reprodução.

Como podemos perceber, a novela retrata uma realidade antiga e conhecida. A função primordial da telenovela é entreter, porém, uma vez que aborda questões de interesse da sociedade, tem a obrigação de fazê-lo com responsabilidade. Na trama, Merlin recebeu uma suspensão da escola e deve retornar logo. Vamos aguardar para ver se Walcyr Carrasco levantará essa questão de forma responsável, prestando assim, por meio de sua novela de grande audiência, um serviço à sociedade.

Por enquanto, a situação criada pelo autor soou apelativa, aleatória, jogada gratuitamente na novela sem contextualização e sem compromisso algum, lançada apenas com o intuito de chocar, de chamar a atenção da audiência. Ou seja, o circo pelo circo. Pior: do que foi mostrado até aqui, o aluno agressor está sendo tratado como vítima. Ponha-se no lugar de um professor que assiste a essa cena e não recebe uma contrapartida justa, que leve à reflexão.

Se o autor não aproveitar essa oportunidade para levantar uma discussão sobre o assunto, toda essa sequência terá servido apenas para a estimulação e banalização da violência escolar, para a naturalização de um comportamento vil. Em vez de usar a polêmica de forma positiva, a contribuição do autor será negativa, perniciosa – o que é extremamente lamentável.

A TV Globo tem uma área de Responsabilidade Social que já levantou ou divulgou campanhas muito boas na área de Educação (Educador Nota 10, Sou Público da Escola Pública, etc). Algumas dessas ações são feitas em parceria com autores de dramaturgia da casa. Falta vigiar a novela das nove, a de maior audiência, portanto, a que exige maior responsabilidade e que deveria ser mais visada. Enquanto o Brasil lidera o ranking de violência escolar, A Dona do Pedaço, até o momento , tem servido apenas para banalizar o problema. Aguardemos.

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